Projeto Mineirinha: enriquecendo as Matas Urbanas
- Luciano Goulart
- 31 de jul.
- 4 min de leitura
Atualizado: 13 de ago.
Em 2023 estive em uma visita ao Museu de História Natural e Jardim Botânico da UFMG (MHNJB) com a equipe do Mata, em que fui apresentado à espécie Mineirinha (Stephanopodium engleri), uma árvore raríssima e indicadora da boa preservação ambiental do local em é encontrada. Nosso guia, o agrônomo Davi Francisco, não economizou nas curiosidades sobre a árvore, que há poucos anos estava praticamente extinta na cidade até ser redescoberta na própria mata do MHNJB por um professor na década de 1990.
Há poucos anos, sob colaboração do Davi, o viveiro do Museu passou a produzir mudas da Mineirinha como estratégia de conservação da espécie, destinando-as aos plantios no próprio MHNJB e na Estação Ecológica da UFMG (localizada no Campus Pampulha). O apelido Mineirinha, cunhado pela própria equipe do Museu, faz jus ao endemismo da espécie ao Quadrilátero Ferrífero. Em outras palavras: em nenhum outro canto do mundo tem-se registro de ocorrência natural da Mineirinha.

Restrita a uma área já bastante antropizada e degradada, a Mineirinha é atualmente classificada como “Em Perigo de Extinção” pela Lista Nacional Oficial de Espécies da Flora Ameaçadas de Extinção do Ministério do Meio Ambiente. Diante de uma jóia da nossa região, caracterizada pela transição entre os biomas Mata Atlântica e Cerrado, logo me ocorreu a ideia de plantar a espécie em áreas estratégicas de Belo Horizonte com o intuito de disseminar a espécie e extinguir o conhecimento sobre a espécie que poderia ser símbolo da recuperação ambiental na cidade.
Em janeiro de 2024 fiz contato com a bióloga gerente do Parque Municipal Américo Renné Giannetti (ou somente Parque Municipal) para saber da possibilidade de plantio e manejo da espécie no parque. Gentilmente recebido pela gerência, que aceitou a proposta com entusiasmo, logo seguimos para a logística de transporte e plantio de quatro mudas que comprei no viveiro do Museu em distintos bosques do parque, cada um com condições específicas de insolação visando avaliar o melhor desenvolvimento da espécie.

Uma das principais preocupações manifestadas por Andrea foram com relação ao comportamento das raízes da árvore, que influenciaria na escolha do local de plantio definitivo: se raízes pivotantes, poderiam ser plantadas mais próximas a pavimentos e tubulações; se fasciculadas (laterais), as restrições aumentariam, assim como com relação à altura e preferência por sol ou sombra. Por sorte, a Mineirinha possui raízes pivotantes, altura média de 16 metros e tolera bem a meia sombra, uma vez que ocorre naturalmente em florestas já estabelecidas - isto é, adaptada ao crescimento inicial sem insolação direta.
Um recente estudo da UFMG (disponível aqui) buscou aprofundar os conhecimentos científicos sobre a espécie e sua distribuição na área natural de ocorrência. Os resultados indicaram a existência de 264 indivíduos da espécie em quinze áreas protegidas, sendo que 88 deles estão na mata do MHNJB - por isso tão rara. A versatilidade da Mineirinha surpreende, uma vez que ela é encontrada tanto em terrenos íngremes e planos, marcados por um período de inverno seco bastante característico da nossa região.
Atualmente no Parque Municipal restam 3 mudas em desenvolvimento lento, sendo que uma delas foi depredada pouco após o plantio. O impacto desse plantio foi bastante satisfatório, mesmo que as árvores ainda não tenham crescido tanto, já que a Prefeitura de BH me convidou para participar de um conteúdo digital de divulgação do projeto, veiculado em Abril de 2024, e o jornal Estado de Minas também dedicou uma manchete ao plantio - ainda que sem qualquer menção ao Mata Urbana.

Periodicamente visito as Mineirinhas no Parque para ver se cresceram. Por receio de novas depredações ou furtos, a localização de cada uma ainda é um segredo meu e da Andrea. Esperançosamente elas crescerão e os esconderijos poderão ser exaltados em meio à vegetação com placas informativas sobre a espécie e sua preciosidade.
Por ser uma espécie ameaçada e que ocorre preferencialmente em florestas já estabelecidas, seu plantio em áreas degradadas não é indicado por não oferecer as condições básicas para sua sobrevivência e ainda apresentar riscos como a depredação, sufocamento por capins invasores e mesmo incêndios.
No entanto, novas áreas para plantio da Mineirinha já estão mapeadas e aguardando o período chuvoso e o crescimento das mudas no viveiro. Quem sabe um dia a Mineirinha retoma seu espaço em meio às matas da cidade.
Autor: Luciano Goulart é arquiteto e urbanista pela UFMG, fundador do Instituto Mata Urbana e pesquisador dos ecossistemas nativos de Cerrado e Mata Atlântica na Malha Urbana da metrópole mineira.
REFERÊNCIAS
Fiaschi, P.; Marinho, L.C.; Amorim, A.M.A. Dichapetalaceae in Flora e Funga do Brasil. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: <https://floradobrasil.jbrj.gov.br/FB7328>. Acesso em: 11 ago. 2025
Brina, A. E., Arruda, I. A. de C., Ferreira, M. T. M., Mendes, M. S., Junqueira, P. A., Rezende, S. G., Giorni, V. T., & Anastacio, A. C. S. A. (2025). Ampliação do conhecimento da ocorrência e distribuição de Stephanopodium engleri Baill. (Dichapetalaceae) em áreas protegidas na região do Quadrilátero



Comentários